Roda de indígenas praticando antropofagia, segundo a visão do colonizador Theodor de Bry
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A antropofagia é uma outra imagem do pensamento

rico machado

A prática é uma ritualidade canibal praticada por alguns povos nativos do Brasil. Hoje não mais com humanos como nós. Ficou conhecida nos relatos de vários cronistas dos séculos dezesseis e dezessete.

Se popularizou no modernismo brasileiro, nos anos mil novecentos e vinte, especialmente com o quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, e com o Manifesto Antropófago de Oswald de Andrade.

O conceito e sua imagem do pensamento, ou seja, como ele se organiza enquanto modo de pensar, é objeto de várias reflexões.

Suely Rolnik publicou em 2021 seu livro Antropafagia Zumbi . A obra pensa, a partir do modernismo, como a antropofagia produz subjetividades. Versa sobre como tal prática cria um modo de se relacionar com o outro e com a cultura. Isso, contudo, para a autora não é motivo de alegria.

O argumento é que, de algum modo, a antropofagia foi capturada pelo capitalismo, produzindo subjetividades reativas para mundos prét-a-porter.

Em que pese a antropofagia não esteja imune à poética do mal, que inclusive é parte de sua origem, é importante considerarmos as diferentes formas de abstração deste tipo de pensamento.

A postura pessimista de Rolnik em relação à antropofagia tem a ver com o que ela classifica como sua versão neoliberal.

Da poética do mal ao pensamento outro

Porém se pensarmos a antropofagia nos termos dos povos nativos, trata-se de um pensamento outro, capaz de produzir outras formas de nos relacionarmos com as alteridades e com a humanidade em sua expressão radical em diferentes espécies e seres.

 Apesar de alguns reducionismos retóricos em torno de uma gramática digestiva – de engolir e absorver o outro – Rolnik nos oferece um bom livro para pensarmos criticamente a antropofagia.

Contra antropofagia zumbi, esta em torno de subjetividades flexíveis neoliberais, é a própria autora que sugere ao final do livro recuperarmos a antropofagia em seu polo ativo e criativo.

E aqui, pensando o fenômeno como esta outra imagem do pensamento, Davi Kopenawa e Ailton Krenak, talvez sejam nossos maiores expoentes, de um pensamento nativo crítico, criativo e capaz de inventar outros mundos para além deste que vivemos sobre suas ruínas.

Antropofagia Zumbi, de Suely Rolnik

Antropofagia Zumbi, de autoria de Suely Rolnik, foi publicado pelas editoras N-1 em parceria com a Hedra, dentro da Coleção Lampejos.

Professor da Universidade Federal do Oeste da Bahia - Ufob. Realizou doutorado em Comunicação na Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, na Linha de Pesquisa Cultura e Significação. Jornalista de formação, é mestre em Comunicação pela Unisinos, onde também realizou a especialização em Filosofia.

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